O Gabinete Cibercrime da Procuradoria-Geral da República (PGR) divulgou um relatório alarmante que revela um aumento de 37% nas denúncias de cibercrime em 2023, face ao ano anterior. No total, foram recebidas 2.916 denúncias ao longo do ano, comparadas com as 2.124 registadas em 2022. Este crescimento exponencial reflete uma tendência de aumento contínuo das atividades criminosas no mundo digital, que têm vindo a multiplicar-se de forma “permanente e claríssima”, conforme sublinha o documento divulgado pela PGR.
Cibercrime: Um fenómeno em expansão
Desde 2016, ano em que foram registadas apenas 108 denúncias, a criminalidade informática tem aumentado de forma significativa e constante. Em 2020, por exemplo, foram apresentadas 544 queixas. Agora, com 2.916 denúncias, o Gabinete Cibercrime alerta para a possibilidade de este número ultrapassar os 3.000 casos em 2024, caso a tendência de crescimento continue.
O aumento não se deve apenas à maior quantidade de crimes cometidos, mas também à crescente conscientização pública e à capacidade de denúncia por parte das vítimas. No entanto, o Gabinete realça que ainda existe uma “enorme cifra negra”, ou seja, um número considerável de crimes que não são denunciados devido à vergonha ou descrença na recuperação dos valores perdidos.
Burlas “olá mãe, olá pai” e falsas cobranças de dívidas lideram
Entre as várias tipologias de cibercrime, as burlas informáticas assumem particular destaque. Um dos esquemas mais frequentes em 2023 foi a burla conhecida como “olá mãe, olá pai”, que envolve o envio de mensagens fraudulentas, com os criminosos a tentarem enganar as vítimas ao fazer-se passar por familiares em necessidade financeira. Este tipo de burla representou 227 denúncias, equivalentes a 11,02% do total.
Outra forma predominante de cibercrime em 2023 foram as falsas cobranças de dívidas a empresas, que atingiram 381 denúncias, representando 18,49% dos casos registados. Estes esquemas envolvem a emissão de faturas fraudulentas em nome de empresas ou entidades públicas, induzindo as vítimas a realizar pagamentos indevidos.
Em conjunto, estas duas categorias representam quase 30% de todas as denúncias recebidas no Gabinete Cibercrime, evidenciando a vulnerabilidade tanto de indivíduos quanto de empresas a este tipo de fraude.
Phishing: um crime em expansão
Outro destaque do relatório vai para o ‘phishing’, um esquema que consiste no envio de mensagens ou e-mails falsos com o objetivo de roubar dados pessoais ou financeiros, como números de cartões de crédito ou credenciais bancárias. Em 2023, foram registadas 326 denúncias de ‘phishing’, correspondentes a 16,09% do total. O relatório da PGR alerta que “a generalidade dos bancos portugueses (ou melhor, os seus clientes) foram alvos deste tipo de iniciativas criminosas”, mostrando a sofisticação e persistência dos ataques.
Além disso, o documento aponta para a “extraordinária dimensão” das burlas em compras online, muitas das quais acabam por não ser denunciadas, seja por vergonha ou por falta de confiança na recuperação dos prejuízos. Este tipo de criminalidade, segundo o Gabinete, alimenta as chamadas “cifras negras”, uma categoria de crimes que, embora aconteçam frequentemente, muitas vezes não são oficialmente reportados.
O impacto da pandemia no cibercrime
O relatório reconhece que o impacto da pandemia de Covid-19 contribuiu para o crescimento do cibercrime, uma vez que mais pessoas passaram a realizar atividades online, aumentando assim o risco de serem vítimas de fraudes digitais. Contudo, a PGR sublinha que, mesmo com o esbatimento da pandemia, a tendência de crescimento do cibercrime tem-se mantido “constante e consistente”, revelando que o fenómeno vai muito além das circunstâncias associadas à crise sanitária.
Campanhas criminosas em massa
O ano de 2023 ficou ainda marcado por um aumento de campanhas criminosas em larga escala, desenvolvidas por grupos de crime organizado que visaram simultaneamente numerosas vítimas. De acordo com o Gabinete Cibercrime, estas campanhas representam uma nova fase do cibercrime em Portugal, que passa a ser mais sofisticado e coordenado, com os criminosos a atacarem grandes grupos de pessoas ou empresas ao mesmo tempo, o que torna as operações mais lucrativas para os seus autores.
Crimes económicos e fraudes diversas
Além das burlas e do ‘phishing’, o relatório destaca outros tipos de cibercrime que tiveram um impacto significativo em 2023. Fraudes imobiliárias, propostas fraudulentas de trabalho, burlas em plataformas de vendas online, esquemas de investimento em criptomoedas e ataques informáticos são alguns dos exemplos que fazem parte do vasto leque de crimes digitais.
De notar, ainda, o aumento de tentativas de extorsão através da ameaça de divulgação de imagens íntimas, uma forma de crime que tem vindo a ganhar expressão e que tem levado muitas vítimas a cederem às exigências dos criminosos para evitar a exposição pública.
Um apelo à prevenção
O Gabinete Cibercrime sublinha a importância de se adotar medidas preventivas para mitigar o impacto deste tipo de criminalidade. Para além de uma maior vigilância por parte das entidades financeiras e das empresas de tecnologia, é necessário educar o público sobre os riscos do cibercrime e sobre como identificar potenciais fraudes.
O relatório conclui que, sem uma ação coordenada e eficaz para combater o cibercrime, tanto por parte das autoridades como dos cidadãos, o número de vítimas continuará a aumentar nos próximos anos, colocando em risco a segurança económica e social do país.
Este crescimento contínuo do cibercrime revela que as ameaças digitais se tornaram uma parte inevitável da realidade moderna, exigindo uma resposta robusta e inovadora por parte das autoridades e da sociedade em geral.